quinta-feira, junho 25, 2015

Um cantor, um carro e um final infeliz

Na última quarta-feira, dia 24 de junho, o Brasil amanheceu com a notícia de que um jovem artista, Cristiano Araújo, e sua namorada, Allana Moraes, haviam morrido durante a madrugada em um grave acidente automobilístico. O veículo, ocupado pelo casal e por um dos empresários do cantor, era conduzido por um segurança do grupo, que retornava de um showrealizado na cidade de Itumbiara, localizada há cerca de 200 km de Goiânia, e, por causas ainda não esclarecidas, saiu da pista e capotou no canteiro da rodovia, ficando completamente destruído. Após a divulgação da tragédia, as redes sociais foram inundadas com manifestações de solidariedade às famílias das vítimas e pela comoção dos fãs que, naquele dia, haviam perdido seu “ídolo”. Uma entrevista, porém, chamou minha atenção. Horas depois da confirmação das mortes, o pai do cantor falou com a imprensa e, bastante abalado com o ocorrido, declarou que sentia uma tristeza muito grande. Disse que, todos os dias, fazia uma oração, pedindo a Deus que acompanhasse o filho nas viagens: “Entro no carro ou no avião e faço uma oração. Eu não estava com ele ontem? Será que Deus existe?”

Você talvez não concorde comigo, mas compreendo a dúvida desse pai. Ele acreditava em Deus. Confiava a vida e a segurança do filho a Deus. Pedia a proteção de Deus. No entanto, nada disso parecia fazer sentido naquele momento, quando o corpo do filho amado se encontrava inerte na maca de um necrotério.

Ao longo da vida, fomos ensinados que morrer jovem é sinônimo de injustiça de Deus, como se tivéssemos um “direito adquirido” a oitenta, noventa ou, para os mais “sortudos”, cem anos de existência. Aprendemos ainda a aceitar a morte na velhice, embora isso não a torne, de nenhum modo, menos dolorosa ou estranha ao nosso desejo pela eternidade (Eclesiastes 3:11).

Não fomos feitos para morrer. Nem aos 29, nem aos 99. E ponto. O Criador não incluiu, em Seu plano original, um final para o nosso começo. Fomos feitos à semelhança dEle, com potencial para viver para sempre. A morte foi sugestão do inimigo de Deus, acatada pela humanidade rebelde, que acreditou que o conhecimento do mal compensava o risco.

Cristiano Araújo estava no auge de sua carreira, era um dos cantores mais populares do Brasil e realizava, em média, vinte shows por mês. Vivia a concretização de um sonho perseguido desde a infância, de se tornar famoso e de alcançar reconhecimento por seu talento musical. Tinha dinheiro, amigos e fama – tudo interrompido por um inesperado desvio no trajeto da estrada que o levava de volta para casa.

Alguns dirão: “Mas o que importa é que ele viveu intensamente.” Será? Será que vinte e nove anos, dos quais apenas os últimos quatro ou cinco foram de “sucesso”, são tudo? Será que nos diminuímos a tal ponto de achar que poucos anos “bem vividos” valem mais do que a possibilidade de ser eternos? Não estou falando aqui da trasladação ao paraíso dos desenhos animados, em que nos tornamos seres alados, ocupados com harpas o dia todo. Não acredito nesse conto nada atraente. Refiro-me ao Céu prometido em Apocalipse 21, no qual todas as coisas conhecidas deste mundo serão refeitas, e reunidas as pessoas que amamos. Acredito na promessa de que o próprio Deus Se aproximará de cada ser humano, lhe enxugará dos olhos toda lágrima, e terá a chance de explicar o porquê de cada uma delas. Naquele instante, Ele, que tem tolerado pacientemente nossas acusações injustas e nossas dúvidas a respeito de Seu caráter, abrirá as cortinas dos bastidores do grande conflito e revelará o verdadeiro culpado do tormento e da dor que, nestes dias maus, parecem intermináveis.

Cristiano Araújo e sua namorada estavam em um dos carros considerados mais seguros do mundo. A polícia afirma, porém, que eles não usavam o cinto de segurança no momento do acidente, o que poderia, em hipótese, ter salvado a vida deles. E você? Está seguro em seus planos? Tem um emprego estável, uma família equilibrada e a saúde em dia? Vive o auge da vida ideal? Só não pode negar a existência de desvios na estrada e a possibilidade de que, de um minuto para o outro, tudo vire de cabeça para baixo e você se veja sem chão. Onde está a sua segurança? Nos airbags? Nos freios? No cinto? Ou na mentira continuamente repetida aos nossos ouvidos: “Você não morrerá nunca” (Gênesis 3:4)?

Cristiano e Allana, agora, dormem, aguardando o veredito do julgamento encerrado para eles na madrugada do dia 24 de junho de 2015. Pode ser que, para o leitor deste texto (ou para sua autora), a sentença esteja pronta, aguardando apenas a assinatura do Juiz. Qual terá sido a sua escolha? Viver a ilusão da felicidade dos seus cem anos – se chegar até lá – ou optar pela esperança de que estamos apenas no prólogo da história?

Bruna Mateus Rabelo dos Reis, 29 anos, Goiana

quarta-feira, junho 24, 2015

Para professor da UFRGS, criacionismo é crença infantil

Em entrevista concedida à RBS TV, o professor de pós-graduação Fernando Becker, da UFRGS, comentou a proposta da deputada Liziane Bayer de que se ensine criacionismo em escolas públicas (confira). Várias vezes deixei claro aqui que muitos criacionistas, incluindo os associados da Sociedade Criacionista Brasileira, entre os quais me incluo, discordam de propostas dessa natureza (confira). Mas a argumentação de Becker é por demais rasa e até injusta. Melhor seria terem convidado um criacionista esclarecido para explicar por que o criacionismo não deve ser ensinado em escolas públicas, e não apenas um professor cujas opiniões revelam desconhecimento das discussões sobre o tema. Mais um exemplo de mau jornalismo... Assista aqui e aqui aos vídeos. A seguir, quero pontuar algumas frases do professor.

Becker começa com o lugar comum de que criacionismo é religião e deve ser relegado ao seu “gueto”, digo, à igreja. Ainda que seja um fenômeno cultural, para Becker ele não deve sequer ser ensinado nas escolas. Ele diz que a “função da escola é trazer o conhecimento científico para a população”. Ok, mas instantes depois defende o ensino de uma teoria segundo a qual a vida teria surgido da não vida, há bilhões de anos, e se tornado mais e mais complexa ao longo do tempo. Becker omite o fato de que essa ideia pertence ao campo da filosofia (naturalismo filosófico), e não à ciência propriamente dita. O macroevolucionismo naturalista não pode ser submetido à investigação científica e, portanto, seguindo o argumento do professor, também não deveria ser ensinado em aulas de ciências.

Becker diz que falta tempo para ensinar tantos conteúdos e que, portanto, não haveria espaço para o criacionismo. Essa é boa! Becker é educador e deveria saber que a melhor forma de se aprender a pensar (e não apenas memorizar conteúdos) é analisando o contraditório. Em lugar de empurrar a teoria da evolução – com todas as suas insuficiências epistêmicas – goela abaixo dos alunos, por que não promover um ensino crítico da evolução? Aliás, por que não promover o ensino crítico da própria ciência, como estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em lugar de endeusá-la?

Apoiando o argumento de Becker, a entrevistadora diz que a ciência trabalha com evidências e o criacionismo, com fé. E reforça o lugar comum de que o assunto se trata da polarização entre ciência e religião. Isso é falso! Teoria da evolução não é sinônimo de ciência, tanto quanto criacionismo não é sinônimo de religião. A teoria da evolução conta com evidências científicas (pelo menos no que se refere à chamada “microevolução”), mas mistura um bocado de filosofia naturalista em seu modelo. O criacionismo tem também sua base teológico/filosófica, mas afirmar que o modelo não conta com evidências é desprezar as descobertas da biologia molecular e da bioquímica (que apontam para umdesign inteligente e para a complexidade irredutível) e da geologia catastrofista (que mostra evidências de um dilúvio e de uma coluna geológica não necessariamente tão antiga), por exemplo. Há muitos cientistas sérios discutindo essas evidências. Por que certos setores da mídia e certos professores insistem em ignorar isso? Deixando de lado o componente filosófico dos dois modelos (criacionista e evolucionista), é perfeitamente possível discutir/analisar as evidências apresentadas por ambos os lados. Dizer que a questão se resume a ciência versus religião é evitar o debate e blindar o evolucionismo.

O pior mesmo é Becker dizer que “a religião trabalha com o emocional e com a crença, a ciência trabalha com a razão e a evidência”. Que absurdo! Primeiro, porque cientistas não são máquinas. Eles possuem pressupostos, preconceitos, subjetividades, opiniões, cosmovisões, e isso tudo certamente interfere na forma como veem as coisas. Seria bom Becker estudar um pouco Thomas Kuhn. Segundo, porque teólogos estudam, sim, evidências e usam e muito a razão e ferramentas científicas. Dediquei cinco anos a um mestrado em que estudei hermenêutica, ciência e religião, sociologia, arqueologia bíblica, antropologia e outras disciplinas. Mestrado em quê? Teologia. Becker deve estar pensando em certas religiões emocionalistas que não dão valor ao estudo acadêmico, e mais uma vez cai no lugar comum.

O professor cita o encantamento de Einstein com o fato de o Universo ser inteligível e, sem querer, dá um tiro no pé, colocando em cheque sua defesa do naturalismo. Essa é uma grande questão. Como explicar o fato de que nosso cérebro, nosso intelecto consegue entender o Universo, a realidade que nos cerca? Se somos apenas um ajuntamento fortuito de moléculas, por que devo aceitar as conclusões desse cérebro simiesco a respeito? Por que devo crer que a massa cinzenta de átomos e moléculas que compõem o cérebro de Becker está fazendo uma análise correta do assunto sobre o qual está discorrendo?

Para o docente, não há como conciliar ciência e religião. Mas ele deveria dizer isso para Galileu, Copérnico, Kepler, Newton, Pascal, Pasteur, Collins e tantos outros. O que ele deveria ter dito é: não se pode conciliar o naturalismo filosófico ateísta com a cosmovisão bíblico-criacionista. Aí estaria coberto de razão.

Mais uma pérola beckeriana: “A biologia fala que a vida apareceu neste planeta há três e meio bilhões de anos.” Não, a biologia não diz nada sobre isso. Os biólogos se ocupam da vida e só podem estudar a vida que eles têm ao alcance dos olhos, das mãos, do microscópio. Quem afirma que a vida “apareceu” (abracadabra!) neste planeta são os evolucionistas e sua teoria. Novamente Becker confunde um modelo hipotético com uma área da ciência empírica.

E o professor universitário termina “apoteoticamente” sua entrevista com uma frase de efeito, afirmando que os que os que defendem o criacionismo são “adultos professando crenças infantis”.

Essa entrevista quase desastrosa e totalmente parcial ajudou a firmar minha convicção de que o criacionismo não deve mesmo ser ensinado em escolas públicas. E um dos motivos que me convencem disso é o risco de que ele seja ensinado por professores como Becker.

Michelson Borges

terça-feira, junho 09, 2015

Deboche, blasfêmia ou pedido de socorro?

A 19ª Parada Gay de São Paulo, realizada no último domingo, levou, como de costume, milhares de pessoas para a Avenida Paulista. Lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais de todo o país se reuniram para pedir “respeito pela diversidade”. Durante a coletiva de imprensa que abriu o evento, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e o governador do estado, Geraldo Alckmin, também foram cobrados pelos manifestantes sobre a atuação do poder público em relação aos direitos LGBT. Além das roupas chamativas (e da falta de roupas de sempre), uma situação chamou a atenção, pois as fotos ganharam as redes sociais: uma ativista gay foi “pregada” a uma cruz, imitando a crucificação de Jesus, e acima dela foi colocada uma placa com a frase “Basta de homofobia”. Em seu Facebook, o deputado evangélico Marco Feliciano se manifestou: “Isto pode? Esta blasfêmia pode? Profanar nossa fé pode? Debochar de símbolos sagrados publicamente pode?” E destacou que no cartaz logo abaixo da cruz estavam relacionadas as entidades que apoiaram o evento: Petrobras, Prefeitura de São Paulo, Governo Federal, Caixa Econômica Federal.

Um blogueiro anglicano analisou a questão sob outra ótica: “Particularmente, não me senti nem um pouco ofendido ao ver uma ativista gay pregada numa cruz. Afinal, Jesus não morreu somente por héteros. Na cruz, Ele Se identificou com os excluídos, os oprimidos, os marginalizados, e ao fazê-lo, assumiu em Si todos os nossos pecados e mazelas, sejam de que natureza forem, inclusive sexual. Não há dilema humano que não caiba na cruz. [...] O que vi representado naquela cena foi o sofrimento de um segmento que tem sido vítima de nosso preconceito, nojo e ódio. O que deveria nos incomodar não é a cena em si, mas aquilo que ela pretende denunciar. [...] O que para alguns pareceu um insulto, para mim soou como um pedido de socorro.”

Desta vez, pode ser. Mas houve ocasiões em que, durante uma parada gayna Jornada Mundial da Juventude (católica) e no Rio de Janeiro, figuras e símbolos religiosos católicos foram realmente vilipendiados. Aí a história é outra... Respeito se conquista com respeito.

Mas o fato de a ativista usar uma cruz para reivindicar respeito talvez não chegue a caracterizar desrespeito. Quando era jovem e católico, eu mesmo participei de uma encenação em que fui crucificado (confira). E embora essa não seja, evidentemente, a melhor maneira de defender uma ideia (hoje, naturalmente, penso de modo diferente), meu sentimento naquela ocasião não foi o de um blasfemador, muito pelo contrário. Eu já amava Jesus e valorizava o que Ele fez por mim. Quem pode julgar o que se passava no coração daquela crucificada na Paulista?

De qualquer forma, ainda que fosse uma ofensa calculada para atingir os cristãos (e não estou dizendo que desta vez foi), nosso Mestre nos orientou a orar pelos que nos perseguem (Mt 5:44). Não foi?